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  • Foto do escritorDaniela Luz Lemos

Memórias de um Carnaval: gordofobia, acessibilidade e saúde

Atualizado: 28 de mar. de 2022


Voltei. Depois de um mês super conturbado, desse ano que mal começou, estou aqui para conversar com vocês, Lilis que nos acompanham. E a pauta de hoje é justamente sobre um dos motivos da minha ausência recente, em uma coluna bem pessoal.

Contextualizando: no Carnaval, eu havia alugado, junto com uma turma de amigos, uma casa em Escarpas do Lago, para passarmos o feriado. Seria a minha primeira vez na cidade, já que lá não é tão barato assim. Nos organizamos e fomos. Cheguei na sexta à noite e no sábado de manhã já sofri um acidente.

Todo o ocorrido foi super bobo. Eu nem tinha bebido nada alcoólico, mas pisei em falso em um degrau pequenininho e caí da minha própria altura. Nessa queda, virei de mau jeito e foi aí que o caos aconteceu.

Torci feio o pé esquerdo e desarticulei o pé direito, movimento que acabou gerando também a fratura da minha fíbula, aquele osso mais fino da perna, sabem? Por fim, o saldo disso tudo foi 1 cirurgia, 6 pinos na perna, ligamentos parcialmente rompidos e 2 meses de recuperação, praticamente sem andar.


Aí vocês me perguntam: Dani, o que isso tem a ver com o tema que você propôs?


Dado o contexto, após eu ter assimilado toda a confusão e processado os prejuízos físicos, financeiros e emocionais, comecei a pensar em pontos críticos dessa história. Aqui embaixo, cito os 3 principais para vocês:


Primeiros Socorros


Assim que o acidente aconteceu, meus amigos chamaram uma ambulância. Contudo, quando ela chegou, percebemos que, definitivamente, o paramédico não estava preparado para executar o meu resgate.

Havia apenas um profissional, um pouco mais velho, sem nenhuma ajuda, que alegou que não conseguia me levar até embaixo, já que para chegar na porta do imóvel, eu precisava passar por dois lances de escada.

Para minha sorte, quase todo o pessoal da casa era da área da saúde. Eles fizeram uma atadura improvisada em mim, me instruíram e, os que eram mais fortes, conseguiram me levar até a ambulância em segurança.

Mesmo tudo dando certo, eu achei extremamente preocupante. Não sei se vocês já passaram por algo parecido com o que passei, mas a dor é imensa. Se meus amigos não me ajudassem, como eu teria recebido suporte sem o auxílio necessário? Esse é um ponto.


Acessibilidade


Bom, passado o primeiro susto, começa a saga da cadeira de rodas. Várias pessoas se ofereceram para me emprestar uma durante esse período. Além disso, eu e minha família também olhamos algumas para alugar. Nenhuma cabia no meu quadril.

Nem mesmo no consultório ortopédico que estou sendo atendida havia uma cadeira que servisse para mim. Para que eu pudesse chegar até a sala de atendimento, precisamos pedir uma emprestada para o hospital ao lado, a única que deu certo.

Eu sei que a falta de acessibilidade no país existe não é de agora, mas sentir tudo isso na pele com certeza fez com que eu aprofundasse o meu olhar sobre o assunto. E por fim não achei a cadeira de rodas mesmo, estou apenas com uma de banho para usar em casa.

Eu não sou uma mulher com corpo padrão, mas sei que existem muitos corpos maiores que o meu. Se eu não consegui uma simples cadeira, por 2 meses, como vivem essas pessoas que precisam disso para ter qualidade de vida? Não é fácil.


"Preocupação com a saúde"


Por fim, esse ponto aqui não poderia faltar: a falsa preocupação com minha saúde, revestida daquele fundinho de preconceito, que a gente custa a perceber que é problemático, mas que é importante observar.

Como vocês podem imaginar, contei essa história várias vezes no meu círculo, conforme ia atualizando as pessoas ao meu redor da minha situação. Pois é, vocês não fazem ideia da quantidade de pessoas que começou a me indicar nutricionistas e/ou dietas para me manter no peso nesse período que estou sem poder me movimentar.

Pessoas próximas, pessoas sem proximidade alguma, pessoas que não conhecem meus hábitos, nem sabem se eu já faço acompanhamento médico... O comentário veio, diversas vezes, como um dos primeiros tópicos da conversa.

Honestamente, não fico brava com quem me falou isso. Acho que a pressão estética faz com que a gente distorça muito a realidade na nossa cabeça, principalmente sendo mulher. Mas eu ainda fico com uma tristeza global por perceber isso acontecendo tanto assim.

Enquanto minha preocupação era quando eu iria andar de novo, como eu iria lidar com a dor e o desconforto, quanto isso iria afetar minha rotina etc. - a preocupação da sociedade era se eu iria engordar. Conseguem perceber que loucura?

Recentemente, a Dora Figueiredo postou que estava recebendo elogios sobre seu corpo, pois emagreceu. No vídeo, a influencer rebate que não está nada bem, depois de ter perdido a sua cachorrinha, e que as pessoas precisam parar de associar automaticamente corpo padrão com saúde e não-padrão com a falta dela. É exatamente o que acontece.

Moral de toda essa história? Não sei dizer. Estou finalizando meu primeiro mês de repouso e ando bastante reflexiva. A verdade é que ninguém muda o mundo sozinho. Apesar dos pesares, tenho recebido bastante apoio de pessoas maravilhosas durante esse período que não tem sido fácil. Isso me fortalece muito.

Mas pensando enquanto sociedade, só vamos conseguir mudanças significativas na pauta da gordofobia e em qualquer outra pauta se exercermos a empatia com o outro e todos comprarmos as grandes brigas. Juntos. Por qual problema, que não te afeta diretamente, você luta hoje? Fica aí o questionamento.

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