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  • Foto do escritorLarissa Tassin

Mulheres trabalham mais e ganham menos na área de finanças, indica pesquisa realizada pela FGV EAESP

Estudo analisou a desigualdade de gênero no mundo das finanças e orienta caminhos para combater estereótipos que prejudicam o público feminino de adentrar e crescer nesse setor


“Podemos constatar que mulheres trabalham mais e são menos remuneradas em comparação aos homens dentro do mercado financeiro no Brasil”, declara a coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGVcef), Claudia Yoshinaga. A professora liderou a publicação de um artigo que demonstra como as mulheres são sub-representadas no setor de finanças brasileiro, tanto em nível de cargos quanto em remuneração. Além disso, o estudo, que foi veiculado na edição de junho da Revista GV-executivo, também aponta formas de mudar esse cenário.

Para realizar a pesquisa, foi aplicado um questionário a 214 pessoas que atuam no mercado de finanças brasileiro, a fim de entender os desafios para a participação feminina nessa área. Entre os participantes, 39,25% foram mulheres, contra uma participação masculina de 60,75%.


Contudo, o que chama atenção, de acordo com Yoshinaga, é o fato de, mesmo sendo minoria nesta área, as mulheres que participaram da pesquisa trabalham cerca de 60,4 horas por semana; uma jornada média maior em comparação aos homens, que trabalham, em média, 57,8 horas no mesmo período.


Mulheres na carreira de finanças


Dados do Think Tank Official Monetary and Financial Institutions Forum (OMFIF) apontam que mulheres ocupam apenas 35% em conselhos dos 50 maiores bancos comerciais do mundo. Em cargos de liderança, esse índice é menor ainda, diminuindo a participação feminina para 19%, com somente 16% de CEOs sendo mulheres.

Quando o assunto é finanças, no Brasil a desigualdade de gênero é ainda maior. Se no mundo inteiro as mulheres equivalem a 18% dos profissionais certificados pela Chartered Financial Analyst (CFA), certificado fundamental para atuar no mercado financeiro, no Brasil esse índice diminui para 11%.

O estudo do FGVcef também investigou qual é a primeira formação das pessoas que atuam nessa área. Entre homens e mulheres participantes da pesquisa, 63,55% possuem graduação em Administração, 14,95% em Economia e 12,15% em Engenharias.


Salário e crescimento profissional


Além de menos representatividade e menos remuneração, as mulheres também costumam enfrentar mais dificuldades quando o assunto é crescimento profissional dentro desse setor. Entre os participantes da pesquisa, aproximadamente 30% estavam no cargo de analista, outros 6,5% como estagiários, 13% associados, 15,9% gerentes, 7% superintendentes, 8,4% diretores, 2,8% vice-presidentes e 11% eram sócios.


Figura 1 - Gráfico sobre o crescimento profissional entre homens e mulheres na área de finanças. Fonte: Checon et al. (2023).

Apesar de a distribuição entre os analistas serem quase a mesma, quando se trata de cargos mais elevados, a participação feminina cai drasticamente, com mulheres ocupando apenas 7% dos cargos de liderança. “Mulheres são minoria no topo da carreira financeira e lidam com um duplo teto de vidro: alcançar posições gerenciais e cargos com remunerações mais altas”, ressalta Yoshinaga.


Em relação aos salários, o estudo encontrou que as mulheres estão no topo somente nos cargos mais altos, como sócia ou diretora. Nos demais, desde a estagiária até a superintendente, não havia mulheres com maior remuneração que os homens ocupando o mesmo cargo, principalmente quando se trata do cargo analista, que possue a melhor distribuição entre gêneros.


Figura 2 - Gráfico sobre o crescimento salarial entre homens e mulheres na área de finanças. Fonte: Checon et al. (2023).

Outro tipo de desigualdade nesse setor pode ser associado às subáreas do mercado de finanças, nas quais os homens são maioria em Asset Management, área responsável por administrar e investir o patrimônio de uma pessoa ou empresa. Comercial e Vendas, Tecnologia da Informação e Investimentos são outros exemplos dessa área que possuem a maioria dos profissionais homens.

“As únicas subáreas em que mulheres são a maioria são aquelas relacionadas a funções administrativas e de apoio, onde as mulheres representam 10,7% contra 5,4% da parcela masculina entrevistada nesta pesquisa”, destacou a professora. Para ela, essa realidade está relacionada com um longo histórico de machismo que perpetua na sociedade há gerações e afasta as mulheres das áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM, sigla conhecida no idioma inglês).


Peso histórico e herança social


Diante dessa realidade, uma parte desta pesquisa buscou entender se as mães e os pais dessas pessoas que trabalham com finanças possuem formação superior em STEM. Foi constatado que 30% dos pais de quem participou da pesquisa são formados em Ciência, Tecnologia, Engenharia ou Matemática, enquanto apenas 11% das mães possuem formação nessas mesmas áreas do conhecimento.

Yoshinaga destaca que esse é um dado muito relevante, pois existem evidências científicas de que filhas de mães formadas nessas áreas tendem a ter uma predisposição maior para seguir carreira em exatas, por lidar desde cedo com esse modelo inspirador. Já os filhos homens tendem a crescer com outra mentalidade diante do mesmo exemplo.

Segundo a pesquisadora, é necessário levar em consideração também que, além da jornada de trabalho formal, as mulheres costumam conciliar essas demandas com atividades domésticas, maternidade, entre outras responsabilidades. “Se levássemos em conta todos esses fatores, a disparidade das horas trabalhadas entre os dois gêneros poderia ser ainda maior”, declarou.

Além disso, a professora relembra que historicamente as mulheres estão ligadas a afazeres domésticos, e este senso comum corrobora até hoje, dando a entender que mulheres são menos eficientes na área de exatas. Para ilustrar como esse preconceito está enraizado na sociedade, ela dá exemplos dentro da própria língua portuguesa.

“Ora, toda a riqueza que você acumula na vida em termos de dinheiro e bens materiais se enquadram como patrimônio, enquanto o matrimônio é caracterizado pelo casamento. A própria língua portuguesa foi concebida sob esse viés de que as mulheres estão associadas a trabalhos domésticos e por isso não seriam aptas para lidar com finanças”, comentou a professora.

Ela afirma que todo esse cenário é contraditório, visto que inúmeros dados socioeconômicos do país apontam que a maioria dos lares brasileiros são chefiados por mulheres:

“Ou seja, as mulheres servem para administrar uma casa, mas não uma empresa? Antigamente, mulheres não podiam trabalhar e, como ficavam limitadas ao matrimônio e não ganhavam o próprio dinheiro, não tinham basicamente o que gerir, além do ambiente familiar. Muito depois, quando as mulheres já ocupam diversos espaços no mercado de trabalho, ainda há a cultura perversa de que a gestão de finanças não é para elas”.

Segundo Yoshinaga, todo este cenário histórico e social, com mulheres inseridas em lares e famílias nas quais a cultura perpetua esse tipo de pensamento é somado a um mercado de trabalho com condições desfavoráveis para a mulher. Para ela, esses fatores aumentam a convicção do público feminino de que não é possível adentrar na área de finanças.

“Este é um peso cultural das mulheres, elas são tolhidas desde a infância e, por mais que tenhamos melhorias nos últimos anos, é preciso entender que isso se trata de quebrar o sistema de forma transgeracional. Por isso, um recorte deste projeto incluía a pesquisa sobre a formação de mães e pais das pessoas que atuam na área de finanças, para conseguirmos medir o quanto avançamos e onde estamos no sentido de quebrar esses estereótipos de gênero”, disse a pesquisadora ao acrescentar que este estudo também fez uma revisão de literatura sobre a presença da mulher no mercado de trabalho.


Transformando a realidade


Yoshinaga explica que, devido a toda esta cultura, o mercado de finanças pode espantar mulheres talentosas de adentrar nessa carreira e, para combater isso, é necessário tornar esse ambiente mais convidativo. “Mostrar as nossas conquistas e dizer que temos chance de mudar este cenário talvez sejam os passos iniciais”, disse.

Ela complementa que é necessário criar políticas públicas capazes de fortalecer a presença e o crescimento da figura feminina nessa área. “Em primeiro lugar é preciso estimular a formação de mulheres em finanças, bem como ofertar vagas específicas para mulheres e criar políticas de promoção e remuneração transparentes.”

Outras ações que também podem contribuir para alterar esta realidade trata-se de promover canais institucionais para denúncia de assédio, melhorar as condições de trabalho e divulgar mais os dados de cargo e remuneração no setor de finanças divididos por gênero.


Para ler o artigo na íntegra, basta clicar aqui. Também é possível conferir o Trabalho de Conclusão de Curso, estudo que deu origem ao artigo, através deste link. Neste trabalho, também foi realizada uma pesquisa qualitativa, com 12 mulheres, investigando outras questões acerca do espaço feminino dentro do mundo das finanças.


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